Novidade criada pela reforma tributária que estabelece a devolução de tributos pagos por pessoas mais pobres, o chamado cashback de impostos deve ter impactos distintos na renda dessa parte da população, dependendo da região do país em que o contribuinte resida.
O benefício pode elevar a renda das
famílias mais pobres em 10%, em média, sendo que as regiões Centro-Oeste (12%),
Sudeste (11%) e Sul (10,1%) terão expansões maiores que as do Norte (8,32%) e
Nordeste (7,76%).
A medida, entretanto, não deixa de ser um instrumento de
combate à desigualdade de renda. Os cálculos e a avaliação estão em um estudo dos pesquisadores Rafael Barros
Barbosa, Glauber Nojosa e Francisco Mário Martins, publicado pelo Instituto
Brasileiro de Economia (Ibre) da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A explicação para a diferença entre as regiões está no nível
de consumo das famílias. Como o Norte e Nordeste têm rendas e consumos menores,
eles são menos beneficiados que as famílias das demais regiões.
direito – Sancionada em janeiro de 2025, a reforma tributária criou o cashback para tornar o sistema de cobrança
de impostos mais progressivo, isto é, para fazer os pobres pagarem,
proporcionalmente, menos impostos do que os mais ricos.
O imposto cobrado na conta de água, por exemplo, é o mesmo
para todos os consumidores, mas pesa bem mais no orçamento de uma família mais
pobre. Com o cashback, esse valor
pago é devolvido aos mais pobres, fazendo com que tenham um alívio tributário
não estendido às demais famílias.
Por isso, um dos
critérios para ser elegível ao cashback
é estar inscrito no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal
(CadÚnico), que admite renda mensal por pessoa na família de até meio
salário mínimo. Hoje, o mínimo é de R$ 1.518, e o CadÚnico tem quase 95 milhões de inscritos.
Quanto – O cashback é de 100% do valor pago em
Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e de 20% do Imposto sobre Bens e
Serviços (IBS),
presentes na compra de bens e serviços considerados essenciais, como nas contas
de água e esgoto, energia, telefonia, internet e gás de cozinha.
Para os demais produtos consumidos
por essas famílias, o ressarcimento é de 20% do CBS e do IBS. Essas duas siglas são a nova
nomenclatura de tributos que foram unificados (ICMS, ISS, IPI, PIS e COFINS)
pela reforma. A previsão é o cashback de CBS começar em 2027; e a do
IBS em 2029.
Nível de consumo – De acordo com o pesquisador Rafael
Barros Barbosa, professor de economia aplicada na Universidade Federal do Ceará
(UFC), famílias do Norte e Nordeste têm
menor renda e, consequentemente, menor nível de consumo.
Assim, a devolução de imposto
também acaba sendo menor que nas demais regiões. “O pobre no Nordeste consome menos que um pobre no
Sudeste e um pobre no Sul, isso é um fato, não tem muito como a gente
contrariar quando a gente olha os dados”, afirma.
Para medir o comportamento de consumo das famílias, os
pesquisadores utilizaram dados da Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O pesquisador aponta, ainda, outro
fator: a informalidade, maior no Norte e Nordeste. Essas famílias gastam no comércio
informal valores proporcionalmente maiores que no Sudeste, por exemplo.
No entanto, o cashback só pode ser apurado em compras
formais, com emissão de nota fiscal. "Tal fato pode excluir grande
parte do consumo de famílias de baixa renda, realizado em comércios informais,
como feiras livres, vendedores ambulantes ou pequenos negócios não
regularizados, que são cruciais no cotidiano da população de menor poder
aquisitivo nessas regiões mais pobres”, diz o estudo.
Com informações do IBGE, os autores apontam que, enquanto a taxa de informalidade no país era,
em média, 40,9% da população em 2022, no Norte e no Nordeste era 60,1% e 56,9%,
respectivamente.
Estímulo à formalidade – Rafael
Barbosa acredita que um dos efeitos da reforma tributária será, justamente,
diminuir a informalidade no país. Isto porque a reforma determina que uma empresa, para se
beneficiar dos créditos tributários, deverá ter fornecedores legalizados.
A ideia é forçar uma formalização da cadeia de produção, da
matéria-prima ao bem final. “Com esse procedimento em cadeia, isso força que o
agente, lá na ponta, obrigue que seus fornecedores sejam formais”, salienta.
Outro incentivo viria pelo
interesse das próprias famílias, que tenderiam a dar preferência para fazer
compras em estabelecimentos formais, com o intuito de receber o cashback. “A pessoa pobre pode ter duas opções, ou compra no
mercado informal, onde não vai ter cashback,
ou em um mercado formal, onde vai ter o cashback”,
destaca.
Distribuição de renda – Apesar da diferença regional, os
pesquisadores do Ibre/FGV reforçam que o cashback
tributário é uma ferramenta que favorece a melhor distribuição de renda. “O que
a gente mostra é que, no geral, olhando do ponto de vista nacional, o cashback vai aumentar a renda da população
mais pobre, aproximadamente, em 10%, então, haverá uma redução da
desigualdade”, diz Barbosa.
O pesquisador do Ibre acrescenta que política direcionada,
como o cashback, pode ser mais
efetiva que isenção linear de impostos, como
a desoneração da cesta básica, outro item da reforma tributária. “Cashback é um dinheiro que retorna para
um grupo específico de pessoas. Já a isenção não distingue classes sociais.
Seja eu pobre ou não pobre, se eu for no supermercado comprar esse item, eu vou
me beneficiar”, explica.
Sem pressão de migração – O professor da Universidade Federal
do Ceará não espera que a diferença de aumento de renda entre as regiões possa
intensificar a migração interna no país. “O efeito é muito pequeno para forçar
uma migração. A migração, em geral, é por questões mais de oportunidade de
trabalho, e não necessariamente para ter acesso a um benefício maior”, avalia.
*Com informações da Agência
Brasil.