Escrever é tarefa melindrosa, descobre-se ao longo de anos de ofício. Na juventude, a alguns falta conteúdo e estilo, mas sobra disposição, convertida em textos com desassombrada frequência. Correr os dedos sobre o teclado, embalado por esses ruídos característicos, produz, em muita gente, uma indescritível sensação de prazer.
“Travar”,
como se diz por aí, não conseguir escrever por qualquer razão era impensável. Inadmissível.
Pelo menos pra mim. Vá lá que a inspiração sempre escasseia, mas o bruto
apetite de tamborilar freneticamente, castigando o teclado, impelia,
encorajava.
Claro
que, no começo, sempre há o compromisso com o exercício contínuo, é só através
dele que se adquire experiência, se burila um estilo, um padrão de escrita.
Fastio,
portanto, é desculpa de preguiçoso, diria com arrogância noutros tempos. Ou –
sei lá – vaidade de quem tem inclinações literárias, mesmo que vagas. Mas o
fato é que, às vezes, bate mesmo um fastio, uma ojeriza quando se pensa no
teclado e na tela luminosa. Talvez seja parte de uma crise qualquer – filosófica,
profissional, etária, pessoal – ou uma difusa decepção com certos fatos que
surgem aí no dia a dia.
Não,
no momento não se pode alegar falta de assunto. A vitória de Donald Trump, a
extrema-direita arreganhando os dentes, a violência endêmica, os impulsos
histéricos nas mídias digitais, o indescritível calor feirense que evoca as
mudanças climáticas, tudo isso e muito mais é assunto que está na ordem do dia,
como se dizia antigamente.
Dizem
que, com a maturidade, consegue-se antever muita coisa que, para os mais
jovens, é novidade. Talvez seja verdade. Mas é verdade também que esta
antevisão traz algum enfado. “Isso de novo!” ou “Já vi isso antes!” são reações
comuns.
Sobre
a escrita, com a idade, também, acaba-se desenvolvendo um estilo, mesmo que
mal-ajambrado. Isso conforta um pouco quem escreve e até justifica o ócio
eventual.
Mas
o fato é que veio aí uma fase de fastio, de desinteresse pela escrita. Atenuada
a crise, o interesse reaparece, mesmo que irregular, sujeito a espasmos. Então
vou tentando retomar aos poucos, equilibrando limitações físicas e mentais.
Quem
sabe se, mais à frente, não se aborda uma questão de relevo, um assunto prático
que interesse quem lê?