A denúncia foi de que havia um cadáver no banheiro utilizado por pacientes do hospital
Quatro diretores do Hospital Geral Roberto Santos (HGRS) foram exonerados dos seus cargos ontem. A decisão, publicada no Diário Oficial do Estado, ocorreu dois dias depois de o Correio denunciar que um cadáver havia sido deixado em um banheiro utilizado por pacientes da emergência da unidade, na segunda-feira.
A reportagem também mostrou a superlotação, os corredores lotados de macas e a condição subumana que pacientes são submetidos, alguns deles enfrentando dias inteiros dormindo em cadeiras plásticas. Enquanto isso, a Secretaria da Saúde do Estado (Sesab) se recusa a informar a causa da morte e a identidade do cadáver do banheiro, sob a alegação de que as informações do prontuário médico são protegidas por lei — ainda que comumente o órgão forneça à imprensa informações sobre estados de saúde e procedimentos em pacientes.
Em nota, a Sesab garantiu que “a substituição da diretoria do HGRS é parte do processo de transição iniciado em janeiro, quando o secretário da Saúde, Fábio Vilas-Boas, tomou posse, com o objetivo de reestruturar a gestão da unidade de saúde, que será focada no tripé assistência, pesquisa e ensino”.
Entre os exonerados está a diretora-geral Delvone Freire Gil Almeida, substituída pelo nefrologista Antônio Raimundo Pinto de Almeida, professor da Faculdade de Medicina da Ufba.
O diretor médico da unidade, Miguel Andrade Mota, também foi demitido, sendo substituído por Hugo da Costa Ribeiro Junior, especialista na área de nutrologia pediátrica. Também foi exonerada a diretora financeira, Jusçara França da Silva Dantas. Para o lugar dela, foi nomeada Rute Nunes Oliveira Queiroz. A quarta e última substituição foi na direção de Engenharia Clínica. Saiu o então diretor Gilson da Mota Machado Junior e entrou em seu lugar Dulce de Carvalho Guedes.
Dos quatro nomes anunciados, um deles já havia sido citado pelo secretário Fábio Vilas-Boas, na segunda-feira, em seu perfil do Facebook. “Estou trazendo o professor Antonio Raimundo Pinto de Almeida para realizar pesquisas no hospital e desta forma angariar mais recursos para a unidade. Trabalharemos com o tripé: assistência, ensino e pesquisa”, postou.
Surpresa
Na terça-feira, o secretário Fábio Vilas-Boas se reuniu com representantes do Sindicato dos Médicos da Bahia (Sindimed). De acordo com o presidente do Sindimed, Francisco Magalhães, apenas a ida de Almeida para a diretoria-geral não foi uma surpresa. “Me parece que já estava programado o doutor Antônio Raimundo entrar para a diretoria-geral”, disse.
No entanto, a exoneração de quatro pessoas surpreendeu o presidente. Segundo ele, apenas dois diretores não teriam interesse em continuar na unidade. “Ontem (anteontem), nós estivemos com ele (o secretário) e perguntamos se haveria mudança na diretoria e ele disse que estava observando os diretores dos diversos hospitais para ver como era o comportamento. Depois, ia fazendo (mudanças) se necessário”, contou Francisco.
Agora ex-diretora-geral do Roberto Santos, a médica Delvone Freire Gil Almeida disse que sua saída já estava programada. “Nossa demissão, no caso a minha e de doutor Miguel (Andrade Mota, ex-diretor médico), já havia sido solicitada, os cargos colocados à disposição”. No entanto, ela disse não poder assegurar se as demissões foram influenciadas pela atual condição do hospital.
“O que tenho a afirmar é que de fato estávamos demissionários”. Delvone assumiu o cargo de diretora-geral em agosto de 2011. Antes, ela havia ficado três anos na Diretoria de Pesquisa e Ensino, onde obteve conquistas como o registro no Comitê de Ética em Pesquisa, o credenciamento como hospital de ensino e a implantação de programas de residência.
Quem é o morto?
Desde terça-feira, o Correio busca informações sobre a identidade e a causa da morte do paciente cujo corpo foi colocado no banheiro. Somente à Sesab, a solicitação foi feita três vezes. Ontem pela manhã, a assessoria do órgão chegou a dizer que a causa da morte não interessava. Mais tarde, disse que a identidade e a causa da morte do paciente eram protegidas por lei.
No entanto, médicos legistas ouvidos pelo Correio ressaltam a relevância da informação, uma vez que pode haver risco de contaminação para quem utilizou o banheiro. Embora o HGRS não seja uma unidade de referência para doenças infectocontagiosas, não há impedimentos de que um paciente com uma dessas enfermidades tenha dado entrada na unidade.
Ofício
O promotor Luciano Ghignone, do Centro de Apoio Operacional de Defesa da Saúde (Casau), do Ministério Público da Bahia (MP-BA), disse que, em visita ao HGRS, na tarde de anteontem, questionou à então diretora-geral da unidade, Delvone Almeida, e ao diretor médico, Miguel Andrade, sobre a causa da morte do paciente cujo corpo foi colocado no banheiro.
“Eu fiz essa pergunta e eles não souberam informar. Mas esse dado foi solicitado formalmente. Além do inquérito civil, eu confeccionei um ofício indagando esses pontos: quem era a pessoa, como ela chegou ao hospital, qual a causa morte, qual a situação do necrotério. Tudo isso foi questionado em ofício e entregue em mãos à doutora Delvone. Ela tem um prazo de dez dias úteis para responder”, disse o promotor.
Mesmo com a exoneração, é mantido o prazo porque o ofício se direciona ao diretor do hospital. O promotor disse também que, no momento da visita, pediu para ir ao necrotério e constatou que, pelo menos naquela hora — a tarde de terça-feira —, não havia problema de superlotação. Apenas dois corpos estavam no necrotério, cuja capacidade é para 12 adultos.
O MP-BA instaurou dois inquéritos – um por improbidade administrativa e outro na área da saúde para apurar a denúncia do cadáver no banheiro. Sobre a superlotação, existe uma ação de 2012.