Tribuna Feirense

  • Facebook
  • Twiiter
  • 55 75 99801 5659
  • Feira de Santana, tera, 22 de abril de 2025

André Pomponet

Crônica da passarela solitária

André Pomponet - 13 de Fevereiro de 2025 | 11h 09
Crônica da passarela solitária
Foto: Washington Nery/PMFS

Quem viu a construção ficou logo imaginando que o equipamento estava fadado ao frenético ir e vir de passantes. Afinal, ligava o Terminal Central ao festejado Shopping Popular. Trata-se da passarela sobre a Rua Olímpio Vital, que interliga os dois espaços.

Pois quem imaginou se enganou: a feia construção acinzentada vive deserta, parece que liga o nada a lugar algum, como se diz popularmente.

Quem sai do Shopping Popular se impressiona com o cinza que prevalece ali. Cinza das fachadas das lojas fechadas, cinza das portas metálicas cerradas, cinza da estrutura da passarela. Cinza até do céu feio, encoberto, que anunciou uma chuva que não caiu.

Trafegando sobre o equipamento – no sentido Norte-Sul –, o pedestre ouve, sob seus pés, o ronco dos motores, o grito estridente das buzinas, imprecações de pedestres, motociclistas e motoristas; poder-se-ia dizer que os mais sensíveis até “ouvem” a tensão do trânsito feirense, intenso e caótico, por ali.

Examinando a paisagem, a Oeste, vê-se o cruzamento da Canal com a Olímpio Vital, as rochas acinzentadas que revestem o canal, propriamente dito; o casario de cores pardas da Rua Nova – há cinza também! –; e, mais à frente, as famosas colinas que circundam a Feira de Santana, naquelas paragens. São verdes, azuladas, mas, nas tardes sem sol, são, também, acinzentadas.

A Leste, o aclive lento conduz ao concreto acinzentado, esbranquiçado, do centro da cidade. Na Olímpio Vital, porém, há árvores, o verde, cujas copas encobrem o tom acinzentando que prevalece sobre os funcionais edifícios comerciais.

No terço final do percurso sobre a passarela, o passante se depara com os despojos de algum desafortunado que vive pela rua. Às vezes, ele está por lá. Mas, na ocasião, só havia um encardido colchão de espuma, papelão, roupas sujas, restos de uma fogueira, um capacete, um caderno escolar.

No trecho final – já na rampa –, a provação final de quem se arrisca a enfrentar a solidão da passarela: vestígios de fezes e de muita urina, capazes de embrulhar qualquer estômago. Fedem e deixam marcas, impregnando-se, como manchas cinzas sobre o piso de concreto.

Depois de muito reter a respiração, o passante descobre que, finalmente, chegou ao Terminal Central...



André Pomponet LEIA TAMBÉM

Charge da Semana

Charge do Borega

As mais lidas hoje