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César Oliveira

As distorções do lockdown

César Oliveira - 02 de Março de 2021 | 17h 38
As distorções do lockdown
Foto: Alex Pazuello/Semcom

Desde o cancelamento de Karol Koncá, no BBB, um assunto não atingia de forma tão passional os brasileiros quanto o lockdown. Há os que dizem que ele não salva ninguém e mata a economia. Outros o apontam como uma das ferramentas essenciais para salvar vidas, porque economia volta, vidas perdidas não. Evidente, também, que fazer lockdown em país desenvolvido, com população de maior poder aquisitivo e suporte social, é muito diferente de fazer no Brasil, um país esfacelado pela corrupção, pobreza e inépcia jurídica. É provável, no entanto, que todos tenham lá suas razões, mas acho que o debate acontece sobre desígnios que não são objeto do lockdwn.

O lockdwon não é para salvar vidas – ao menos, não diretamente –, até porque não é uma terapêutica. O que ele produz é uma redução da taxa de contágio – e isso está provado, exaustivamente, em todos os países que o fizeram e em trabalhos científicos brasileiros –, permitindo que a relação usuário/vaga do sistema de saúde se torne equivalente ou próximo disso, o que levaria a salvar vidas que se perderiam por falta de leitos.

Na primeira onda da pandemia, o objetivo do distanciamento era alongar a curva, ganhando tempo para que fossem comprados os insumos hospitalares que estavam em falta – máscaras, luvas, aventais, respiradores – e para que os leitos hospitalares fossem ampliados. E funcionou. Em vários Estados que agiram corretamente – a Bahia, por exemplo –, não houve colapso da saúde, nem falta de vagas.

Já em Manaus, a combinação de fracassadas administrações municipais e um governador acusado de corrupção criaram o ambiente para o surgimento de uma nova cepa – com maior carga viral e maior poder de contágio –, levando ao colapso do sistema de saúde.

A combinação de maior número de casos, maior taxa de contágio, maior tempo de ocupação de leitos – por ser uma forma mais grave da doença –, menor número de leitos – já que hospitais foram fechados ou sequer abertos, com o desvio de recursos – está levando ao caos, agora, nacional.

Aprendemos, com os resultados de Israel – que já vacinou 57% da população e viu a taxa de casos cair de forma abrupta –, que só a vacina será capaz de controlar a perpetuação da pandemia por novas cepas do vírus. Infelizmente, o governo brasileiro, defensor da eugênica imunidade de rebanho, foi absolutamente desastroso na compra de imunizantes – e fomos salvos, ao menos minimamente, graças ao Butantan – e, só agora, corre atrás do prejuízo.

Enquanto aguardamos a chegada da vacina, dependemos de conter a pandemia no limite que podemos lidar com ela. Novamente, o objetivo do lockdown não é impedir o total contágio – como se prega, equivocadamente – mas achatar a curva e permitir que a relação vaga/paciente seja mantida em um padrão satisfatório. Para isso, devemos cobrar mais leitos, mais transparência, mais fiscalização das verbas (algo do qual sempre nos omitimos), mas também participação da sociedade.

A situação é dramática, mas poderá ser ainda pior o que vamos ver. Por isso o lockdown pode ser necessário, ainda que não tenhamos fôlego para longa intervenção. É preciso compreender o sufoco econômico das pessoas e seus legítimos argumentos. E tentar flexibilizar ao máximo o que for possível, mas reconhecer o papel do distanciamento, parar de distorcer objetivos da medida, cobrar ação do Estado, exigir compra das vacinas, porque, senão, os que ficarão sem fôlego serão aqueles que não voltarão à vida.



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