É impressionante a quantidade de animais abandonados pela Feira de Santana. Cães, gatos e, às vezes, até cavalos, que já não aguentam o repuxo do trabalho, são deixados por ruas, avenidas, praças e, sobretudo, pelos terrenos baldios que vão escasseando pela cidade. Perdi a conta dos filhotes de gato que já vi abandonados pelas calçadas. Dolorosos, os frágeis miados desses animais comovem passantes – sobretudo crianças – que costumam seguir adiante porque não têm solução para dar. Tem quem evite olhar, para não se comover.
Vários terminam atropelados. É comum ver cadáveres sendo destroçados pelos pneus dos veículos, amontoados de pelos e manchas rubras, sobretudo nas grandes avenidas e nas congestionadas rodovias federais que cortam a Feira de Santana. Os que sobrevivem movem-se, penosamente, arrastando seus aleijões.
Enquanto não são atropelados, muitos vão padecendo com a fome e com as doenças. Disputam, nos pontos de lixo, sobras de comida descartadas com displicência. Quando não encontram esses detritos, estendem olhares súplices, dolorosos, para quem passa transportando qualquer coisa comestível. É um comovente e triste espetáculo, às avessas, que nunca tem fim.
Cadelas no cio atraem matilhas que, às vezes, somam mais de dez cães. Um ou outro ainda conserva o pelo limpo, uma coleira eventual, sinal de que se extraviou ou foi abandonado recentemente. A maioria, porém, já padece com a sarna, com as feridas, com a fome e, às vezes, com a agressividade que o abandono e a hostilidade impõem.
Poder público?
Normalmente, a cobrança por providências recai sobre o poder público. É verdade que os animais deveriam dispor de maior atenção, com iniciativas que incluam a castração massiva e campanhas de orientação para os proprietários, que cruelmente descartam bichos como se fossem qualquer produto usado, imprestável.
A maior parcela de responsabilidade pela situação, porém, é da sociedade. Afinal, são as pessoas que tomam a decisão de criar animais. São elas, também, que abandonam, pelas ruas, filhotes de cães e gatos para que morram longe dos seus olhos – deixar numa esquina apostando numa comovida adoção é um exercício de autoengano –, alimentando o espetáculo cruel que se vê com desesperadora frequência.
Nesses tempos ásperos, imaginar que questões do gênero vão sensibilizar os brasileiros – e feirenses – talvez seja ingenuidade. Afinal, aqui se mata seres humanos em escala industrial. E, mais que indiferença, esse genocídio – do negro, do pobre, do jovem –, em muitos, causa alegria, contentamento. Sendo assim com gente, que tipo de tratamento se deve esperar para os animais, não é mesmo?
Mesmo assim, abordar a questão é essencial. Mais do que os seres humanos desafortunados, os animais não têm voz. Quem conserva qualquer traço de sensibilidade não pode, portanto, seguir ignorando a questão. Anos atrás, em Salvador, a prefeitura conduziu uma maciça campanha de castração de cães. O número desses animais pelas ruas da cidade caiu dramaticamente.
Por que não aqui na Feira de Santana também?